RECORDAR É VIVER

sexta-feira, 23 de abril de 2010

O Mineirinho de Ouro – O Vice-Rei

* EDUARDO GONÇALVES DE ANDRADE, ganhou o apelido de TOSTÃO ainda criança.

- TOSTÃO (Foto) hoje é MÉDICO, ESCRITOR e COMENTARISTA ESPORTIVO

Quando tinha sete anos, foi “convocado” para reforçar o time de várzea do bairro que enfrentaria os garotos do Atlético-MG. Ele só entrou no segundo tempo e parecia sumir no meio de meninos de 12, 15 anos. O garotinho marcou um gol e saiu carregado nos braços pelos companheiros.

Havia Toró e havia Tostão. Quem assistia às peladas no IAPI, um conjunto habitacional próximo ao centro de Belo Horizonte, garantia que o primeiro era o melhor. Mas, envergonhado por ser portador de vitiligo, uma doença que provoca manchas na pele, ele se recusava e vestir um calção. Desistiu da bola. O companheiro, não. O time era Associação Esportiva Industriários Como era o mais mirrado e o mais novo do time, ganhou o apelido de Tostão (a moeda já era bem desvalorizada na época) e foi escolhido para jogar na ponta-esquerda, onde se especializou em chutar exclusivamente com a canhota. Um acidente aos 6 anos com uma das unhas do pé direito, impedia Tostão de chutar com o pé destro. O trauma foi superado somente 13 anos mais tarde na Seleção Brasileira onde o preparador físico Paulo Amaral o convenceu a treinar diariamente 200 chutes com a direita, para se tornar um meia completo.

Se o Toró jogava mais, fica até difícil imaginar o que seria se seguisse a carreira, porque o Tostão, o que continuou… este jogou demais. Miudinho em meios aos marmanjos do IAPI, o garoto fazia proezas com a bola, que tão logo chegaram aos ouvidos de um dos principais olheiros de clube de Belo Horizonte: Lincoln Alves, técnico do futebol de salão do Cruzeiro.

Nascimento: Belo Horizonte (25/1/1947).

Posição: Meia-esquerda e centroavante.

Equipes: América-MG (1962/63), Cruzeiro (1963-1972) e Vasco (1972-1973).

Pelo Cruzeiro atuou de 1963 a 1972, com 248 gols (recorde) em 378 jogos.

Títulos pelo Cruzeiro: Foi pentacampeão mineiro (1965, 1966, 1967, 1968 e 1969) e campeão da Taça Brasil 1966 (com menos de 20 anos).

Jogador que detém o recorde de seqüência de artilharia em campeonatos mineiros (105 gols em seis edições seguidas). 1965 (artilheiro com 17 gols), 1966 (artilheiro com 18 gols), 1967 (artilheiro com 20 gols), 1968 (artilheiro com 25 gols), 1969 (artilheiro com 14 gols) e 1970 (11 gols). Também foi o artilheiro do último Torneio Roberto Gomes Pedrosa de 1970 (antigo Campeonato Brasileiro).

Em 1969, ganhou o Prêmio Golfinho de Ouro, para a personalidade brasileira mais destacada no esporte.

Em 1992, foi eleito por jornalistas, técnicos e ex-jogadores como um dos 10 gênios do futebol brasileiro, de 1970 a 1992.

Em 1999, a Revista Placar fez uma eleição, e Tostão ganhou como jogador do século do Cruzeiro e pra finalizar também figura entre os 50 melhores do mundo.

Seleção: 65 (55 oficiais) jogos, 36 gols. Ainda com menos de 20 anos disputou 8 jogos pela Seleção Brasileira, sendo 1 jogo não oficial, e marcou 7 gols. Foi campeão da Taça Independência 1972 (Minicopa) e tricampeão mundial 1970 (onde foi uma das boas peças do conjunto).

Características: muito habilidoso, toques sutis, inteligência nos deslocamentos e na armação de jogo, artilheiro, considerado como um exemplo de jogador moderno, um dos maiores gênios do futebol mundial, passava bem, possuía o drible curto e sempre jogava de cabeça erguida, procurando a melhor jogada… tinha uma visão de jogo espetacular.

Era um jogador muito dedicado. Treinava sozinho após os treinos do Cruzeiro, procurando corrigir suas deficiências. Assim, aprimorou o chute e, principalmente, aprendeu a jogar com a perna direita, seu grande defeito. Muito autocrítico, nunca ficava satisfeito com seu desempenho e sempre achava que podia jogar melhor.

Os mais jovens não o viram jogar, mas receberam informações de sua genialidade. Um ídolo para todas as idades. Para chegar a esta condição, o ex-atacante esbanjou talento pelos gramados de Minas e do mundo.

Com ele, o Cruzeiro acumulou títulos e prestígio internacional. O próprio Brasil deve a ele, Pelé, Gérson e Rivelino o tri de 70.

Primeiro jogador de um clube mineiro a disputar uma Copa do Mundo, na Inglaterra, em 1966.

Craque genial que o mundo ainda reverencia. O mais genial jogador da história do Cruzeiro, onde foi venerado. Inteligente, hábil e técnico; enxergava espaços mínimos dentro de campo. O mineirinho de ouro; um dos maiores craques que o futebol-arte mundial conheceu.

Tostão surgiu no futebol mineiro jogando nos juvenis do América, após iniciar a carreira no Industriários, do conjunto IAPI. Assinou seu primeiro contrato profissional aos 15 anos, em 1962.

Aos 16 anos, o jovem craque aceitou uma proposta do presidente do Cruzeiro, Felício Brandi, e passou a dar expediente exclusivo no Barro Preto, não no futebol de salão, mas no de campo, contratado como profissional, sendo comprado em maio de 1963, por 1 milhão e meio, dos antigos.. Para tirá-lo do América-MG, o Cruzeiro teve trabalho. O então diretor Felício Brandi chegou atrasado mais de uma hora ao próprio casamento só para concluir a contratação de Tostão. Estreou no time profissional no campeonato mineiro daquele mesmo ano, e marcou 6 gols. Daí engrenou na carreira formando o famoso tripé com Piazza e Dirceu Lopes.

Foi recolhido o seu talento, quando ao lado de Dirceu Lopes, com quem formou uma das duplas de maior talento no futebol brasileiro de todos os tempos, arrasamos o Santos de Pelé, impondo uma goleada de 6 a 2, e conquistando em São Paulo, por 3 a 2, o título da Taça Brasil. Nascia o gênio e a primeira convocação para a Seleção.

Assim sendo, com a inauguração do Mineirão, o futebol de Tostão ultrapassou as fronteiras de Minas e do Brasil, e ganhou o mundo, comandando em campo um time fantástico de camisas azuis e cinco estrelas, que tinha craques como Dirceu Lopes, Zé Carlos, Natal, Piazza, Raul e outros.

Estreou na Seleção Brasileira no dia 15 de maio de 1966, em amistoso no Morumbi, contra o Chile, no empate de 1 a 1. O técnico era Vicente Feola. Aos 19 anos, em 1966, ele foi um dos 47 convocados para a seleção brasileira que se preparava para a Copa do Mundo da Inglaterra. Conquistou uma vaga entre os 22 e atuou apenas uma vez naquele Mundial relâmpago para o Brasil. O Brasil perdeu de 3 a 1 para a Hungria, em Liverpool, com gol dele. Foi um dos poucos que se salvaram da fracassada participação na Inglaterra. Em 1969, ao lado de Pelé, levou o Brasil à classificação para o Mundial do México. Tostão foi o artilheiro das eliminatórias com 9 gols. A imprensa já o batizava de ‘vice-rei’.

Tostão foi além das montanhas de Minas – Foi reserva de Pelé em alguns jogos em 1968, sob a direção de Aymoré Moreira. No ano seguinte, sob o comando de João Saldanha, virou o último parceiro de rei com a camisa amarela. 1969 foi o ano de sua consagração. Com dez gols, além de artilheiro, foi o craque das eliminatórias que classificaram o Brasil para o México.

Corria o ano de 1969, ano em que se tornou titular na Seleção, a Seleção Brasileira está jogando um amistoso com o Milionários, em Bogotá, preparando-se para enfrentar a Colômbia pelas eliminatórias da Copa do Mundo poucos dias depois. Era o dia 1.º de agosto. Tostão, um dos maiores craques que o futebol mundial conheceu, domina a bola, mas não consegue evitar o choque com o zagueiro Castaños. E machuca o olho esquerdo, para preocupação de todos os amantes do futebol-arte.

No dia 24 de setembro de 1969 outro lance viria a dividar a carreira de Tostão. Jogavam Cruzeiro e Corinthians, pelo Torneio Roberto Gomes Pedrosa, no Pacaembu, a noite. Tostão recebe o impacto de uma bola chutada pelo zagueiro Ditão de raspão no mesmo olho esquerdo. Sofre deslocamento de retina do mesmo olho esquerdo. A torcida, de Norte a Sul, acompanha sofrida o drama de um craque genial. Do craque e do cidadão Eduardo Gonçalves de Andrade, às vésperas do Mundial do México 1970.

Dia 2 de outubro de 1969, Tostão é submetido a uma cirurgia, em Houston (EUA), pelo médico Roberto Abdalla Moura, no Hospital Metodista de Houston. Tostão. Joga ou não a Copa? Esta era a pergunta mais ouvida em todo o País. Um jovem de 22 anos, inteligente, culto, leitor de autores incomuns a seus companheiros de profissão, ligado nos acontecimentos do mundo, fã de dom Helder Câmara, preocupado com as injustiças sociais, defensor da liberdade e da democracia, temas nada afetos ao universo do futebol. Saldanha caiu na seleção, deu o lugar a Zagallo. Este não acreditava na recuperação do craque mineiro, que era liberado para voltar às atividades a três meses da Copa. O médico Lídio Toledo, também não. Mas, não se sabe se por feeling, pela velha estrela, por superstição, o fato é que Zagallo deu todas as chances a Tostão. Às vésperas do embarque, o craque reassumiu seu lugar no time, ao lado de Pelé. E a dupla atuou as seis partidas da epopéia do tricampeonato mundial. No dia seguinte a cada jogo, o doutor Moura era personagem de uma operação sigilosa que o levava à concentração brasileira, para examinar o olho esquerdo que mais preocupava o Brasil. Mesmo com todo risco e com desconfiança dos dirigentes, com a camisa 9 Tostão disputou a Copa de 1970 e volta do México com seu mais importante título: tricampeão mundial. Quem não se lembra da jogada genial na partida contra a Inglaterra, quando driblou vários adversários e originou o gol da vitória, feito por Jairzinho? Fez ainda dois gols contra o Peru naquele Mundial. Boa parte da crítica européia o apontou como o maior craque do Mundial. Afinal, disputar uma Copa sem o talento inigualável de Tostão seria um risco muito grande.

Por força de um sopro dos deuses da bola, Tostão venceu todos os obstáculos e foi ao México, onde desfilou, jogo após jogo, toda a sua arte. De seus pés – e de seu cérebro – surgiram jogadas empolgantes e gols decisivos. E Tostão, que por pouco não foi à Copa, acabou-se transformando em um dos heróis da conquista do tricampeonato mundial pelo Brasil. Para a imprensa européia, foi o melhor jogador da Copa.

Em 1971, foi escolhido por “El Mundo”, de Caracas, o melhor jogador da América.

Seu último jogo pela Seleção foi na decisão da Taça Independência, em 1972, na decisão do torneio – Brasil 1 x 0 Portugal, gol de Jairzinho.

Em 1971, viveu sua última temporada no clube de Belo Horizonte. Contrariado com a contratação do “sargentão” Iustrich, um disciplinador, não quis mais atuar pelo time. Em abril de 1972, foi para o Vasco da Gama, na maior transação já realizada pelo futebol brasileiro até aquela época (3,5 milhões de cruzeiros ou US$ 535 mil). Estreou no dia 7 de maio contra o Flamengo.

Na Minicopa, meses depois, faria seus últimos jogos pela seleção. No início de 1973, novo exame com o doutor Moura em Houston poria fim a sua carreira. O médico o aconselhou a parar, sob o risco de perder a visão. Com apenas 26 anos, o tímido gênio que encantara personagens como Stanley Mathews, Ferenc Puskas, Alfredo di Stéfano e o escritor Hugh Mc’Ilvaney, que fora tema do filme Tostão, a fera de ouro, de Ricardo Gomes Leite, e da música O jogo, de Pacífico Mascarenhas, saia de cena discretamente, sem festa e sem jogo de despedida, com a mesma elegância com que desfilava pelo IAPI ao lado de Toró, o craque que não foi.

Em fevereiro do ano seguinte, após um amistoso do Vasco com o Argentinos Juniors, Tostão anunciou o final de sua brilhante carreira, com 26 anos. Uma inflamação na retina operada no jogo entre Vasco e Argentinos Juniors levou o jogador novamente a Houston e foi impedido de jogar com o risco de ficar cego. Um ano após chegar ao Vasco, abandona o futebol prematuramente. Tostão marcou seu último gol no dia 10 de fevereiro de 1973, contra o Flamengo. Dezessete dias depois, dá adeus ao futebol, após enfrentar o Argentino Juniors.

Em 1975, passou nos vestibulares da Faculdade de Ciências Médicas e da Escola de Medicina da UFMG. Optou pela segunda e formou em medicina (clínica geral) em 1981.

Dr. Eduardo se recolheu a uma vida simples, tipicamente mineira, ao lado de sua mulher e seus filhos, deixando o Tostão para ser – com muita justiça – idolatrado pelos torcedores que jamais esquecerão a sua imagem.

Voltaria ao futebol na década de 90, principalmente em 1994, após a Copa de 1994, como comentarista esportivo e colunista de várias televisões e jornais.

Em 1993 consta que Tostão era médico e professor da Faculdade de Ciências Médicas e recebeu uma homenagem pelos seus feitos no Cruzeiro.

Em 1997, com 50 anos, médico e comentarista de futebol, Tostão reencontra agora um novo prazer na vida: escrever. Tostão escreveu o livro de memórias “Lembranças, Opiniões e Reflexões sobre Futebol”, pela editora DBA de São Paulo, lançado nacionalmente 23 de agosto.

Dr. Eduardo se recolheu a uma vida simples, tipicamente mineira, ao lado de sua mulher e seus filhos, deixando o Tostão para ser – com muita justiça – idolatrado pelos torcedores que jamais esquecerão a sua imagem Tornou-se comentarista esportivo na década de 90. 21 anos após encerrar a carreira de jogador de futebol resolveu escrever um livro.

O futebol, na concepção moderna de jogo coletivo e solidário, com o craque colocando o espírito de conjunto acima de sua própria vaidade, começou com Tostão, que teve em Cruyff um seguidor perfeito. O futebol, dentro desse conceito, pode ser dividido entre antes e depois de Tostão.

Alguns comentários sobre Tostão

“A tabelinha de Pelé e Tostão confirma a existência de Deus.” (Armando Nogueira, jornalista e escritor)

“A concepção do futebol solidário começou com Tostão.” (Daniel Gomes, jornalista)

“Por mais que eu reze não tem jeito. Esse Tostão é mesmo infernal.” (Dom Serafim Fernandes de Araújo, ex-bispo de Belo Horizonte, torcedor do Atlético Mineiro)

“Poucos jogadores sabiam abrir espaços para os companheiros como Tostão fazia.” (Didi, ex-jogador da Seleção Brasileira)

“Quem viu Tostão pode se considerar uma pessoa feliz.” (Armando Nogueira, escritor e jornalista)

“A ele bastava um palmo de grama para encantar o mundo com dribles e gols jamais sonhados antes.” (Roberto Drummond, jornalista e escritor)

“Tostão pegava a bola no meio-campo, levantava a cabeça e caminhava com a bola como um maestro.” (Marão, EM, março de 2001)

Entrevista com Tostão

1993 -
Na próxima Terça-feira, no Mineirão, o mais genial jogador da história do Cruzeiro, e, certamente, um dos maiores atacantes do futebol mundial, receberá uma tardia, mas justa homenagem da torcida que o venerou por sete anos.

Responsável direto pela ascensão do time mineiro, tirando-o das fronteiras de Minas e lançando-o para o mundo, Tostão ainda permanece na memória de quem viu seu talento encantar platéias e demolir, com a sutileza do seu futebol, as defesas adversárias. Com ele, o Cruzeiro acumulou títulos e prestígio internacional. O próprio Brasil deve a ele, e as outros craques cerebrais como Pelé, Gérson e Rivelino, a sua mais importante conquista: o tricampeonato mundial.

O mundo inteiro ainda reverencia seus feitos e, jamais, poderia relegá-lo ao esquecimento. Hoje, com 46 anos, o Dr. Eduardo convive, perfeita e sincronizadamente, com o seu lado mais famoso, o lado Tostão.

EM – Você vai comparecer à homenagem do Cruzeiro na próxima terça-feira, no Mineirão?

Tostão –
Estarei lá. Fiquei muito feliz com a lembrança, pois, afinal, dediquei boa parte da minha vida de jogador ao Cruzeiro, além, é claro, de ser cruzeirense.

EM – Esta homenagem veio tarde?

Tostão –
Pode até ser. Eu nunca cobrei isso, apesar de ter ajudado o Cruzeiro a ser o que é hoje. Porém, há alguns anos era arredio a esse tipo de coisa. Houve uma época na minha vida em que queria separar o ex-jogador e ídolo da minha vida profissional. Foi um isolamento voluntário para que pudesse exercer a medicina com tranqüilidade.

EM – O que se falava na época era que você tinha horror de ser sido o Tostão?

Tostão –
Isto não é verdade. O Tostão jamais será esquecido ou renegado. O que eu desejava era privacidade. Na época eu ia para o hospital e todo mundo queria autógrafo e dizia ter me visto na televisão. Me incomodava muito, além de prejudicar no desenvolvimento da nova profissão. Agora, convivo muito bem com o meu passado.

EM – Você sempre é citado em publicações internacionais como um dos maiores gênios da bola. Isto o envaidece?

Tostão –
É claro. Até hoje dou entrevistas para a imprensa mundial. Outro dia foi uma emissora de rádio da Inglaterra que fez uma longa entrevista comigo. Recebo dezenas de cartas de várias partes do mundo. Isto mostra que o que fiz no passado ainda está na memória de muita gente.

EM – Há uma versão que diz que, na Copa do México, o técnico Zagallo não queria escalá-lo. Aí, Pelé, Gérson e Rivelino exigiram que o treinador o colocasse no time. Isto é verdade ou lenda?

Tostão –
Não posso afirmar categoricamente. Isto pode até ter ocorrido. O Zagallo realmente me colocou na reserva de Pelé, pois preferia um centroavante típico. Ele chamou Roberto e Dario. No entanto, muitas coisas pesaram para o técnico mudar de idéia. Primeiro foi o jogo de despedida do Brasil, o Maracanã pediu minha escalação. Já no México, vinha treinando muito bem e ganhando a posição. Estou certo, por outro lado, que meus colegas me queriam no time. Se eles exigiram isto do treinador eu não vi.

EM – Lembrando o seu período de jogador vem na memória uma infinidade de craques. Hoje, eles são raros. Você vê algum futuro vitorioso para o futebol brasileiro?

Tostão –
Depois da Seleção de 1970, o Brasil só conseguiu formar outro time genial em 1982. Perdeu a Copa numa das maiores injustiças do futebol. Em 22 anos vi craques nas duas Seleções. Agora, de um ano para cá, o Brasil começa a revelar jogadores. Os craques estão aparecendo, como o Raí, Palhinha II, Dêner, Neto, Zinho e outros. Romário já é realidade. Em Minas destaco Paulo Roberto e Boiadeiro, do Cruzeiro, e Moacir, hoje no Corinthians.

EM – A crônica esportiva vê muita semelhança entre seu estilo e o de Palhinha II. Você concorda?

Tostão –
Concordo. Há muita coisa em comum entre nossas maneiras de jogar. Porém, falta ao jogador do São Paulo mais agressividade, como atacante. Eu sabia ser goleador, além de também ser armador de jogadas. Palhinha II entra pouco na área. É um defeito que ele precisa corrigir. Posso afirmar que ele é mais técnico que o Raí, mas não chega a ser completo como o capitão do São Paulo. (EM, 9 de maio)

Tostão foi ver Ronaldo jogar e falou dos 40 anos do Mineirão

1993 (29/9) –
Nesse ano, depois de uma longa ausência dos estádios, o filho de Tostão o carrega ao Mineirão. O objetivo era ver o garoto Ronaldo (16 anos) jogar pelo Cruzeiro. “Fiquei encantado! Com seu corpo franzino, leve e rápido, ele recuava ao meio-campo para receber a bola, driblava e tabelava até fazer o gol”. Tostão não resistiu e deu uma entrevista acerca dos 40 anos do Mineirão, completado no dia 5 de setembro.

O ex-craque relembra momentos marcantes vividos no estádio da Pampulha.

Site Oficial – O que o Mineirão representa para você?

Tostão –
O Mineirão teve uma importância muito grande na minha carreira e foi um marco na história do futebol mineiro, que passou a ter projeção em nível nacional. Após a construção do estádio, Minas Gerais passou a fazer parte da elite do futebol brasileiro e ter jogadores convocados para a Seleção.

SO – Qual foi o impacto diante da construção do estádio?

Tostão –
o Cruzeiro formou uma grande equipe e ganhou um prestígio enorme no interior do Estado, que, anteriormente, acompanhava os times do Rio de Janeiro e de São Paulo. Jogávamos um futebol bonito e o campo estava sempre cheio em nossas partidas, com caravanas de diversas cidades. Inclusive, a força da torcida do Cruzeiro no interior é algo que permanece até hoje.

SO - Quais os momentos no estádio que ficaram gravados em sua memória?

Tostão
– Foram muitos jogos marcantes, como as vitórias sucessivas sobre o Atlético-MG, que é o maior rival, quando conquistamos o pentacampeonato mineiro. Mas o momento inesquecível foi, sem dúvida, a goleada por 6 a 2 sobre o Santos, no primeiro jogo da decisão da Taça Brasil de 1966, que era o Campeonato Brasileiro da época. O Santos era o maior time do mundo e, depois, acabamos vencendo também em São Paulo. Conquistamos o título e o Cruzeiro passou a ser falado em todo o Brasil.

SO – Qual o gol feito no Mineirão que mais te marcou?

Tostão – Fui artilheiro da equipe durante muitos anos e foram muitos gols importantes, principalmente, em jogos decisivos e clássicos contra o nosso arqui-rival. O mais bonito que marquei no Mineirão, no entanto, foi em um jogo contra o Araxá, pelo Campeonato Mineiro, quando apliquei dois chapéus dentro da área e dei um toque por cima, encobrindo o goleiro.

Entrevista com Tostão acerca do 103 anos de Belo Horizonte
Por que gosta de Belo Horizonte?

Gosto e poderia parar por aqui. Nossa primeira e mais importante relação com o mundo é por meio do prazer, da emoção e da estética. Como somos animais sociais, precisamos convencionar, explicar, racionalizar e pensar numa idéia.

Gosto porque nasci aqui. Tenho uma querida família, raízes e amigos, que me acompanham por toda a vida Gosto porque passei, aqui, minha adolescência e infância, jogando futebol nos campos de terra, driblando adversários e a vida.

Gosto porque no América, Cruzeiro e no Mineirão a glória no esporte me carregou para o mundo.

Gosto porque aqui vivi e me deliciei com uma segunda vida: de médico e professor de medicina.

Gosto porque aqui vivo uma terceira vida: de comentarista de futebol.

Tostão escreve um livro

1997 – Reconciliado com o esporte que o projetou como um dos maiores jogadores de todos os tempos, de novo Tostão, o ídolo, o craque, o homem público, Eduardo Gonçalves de Andrade, 50 anos, médico e comentarista de futebol, reencontra agora um novo prazer na vida: escrever. “Nada é igual a jogar boa, claro, mas é sempre um prazer”. Para celebrar esta reconciliação, contar histórias e impressões sobre esta paixão maior, Tostão escreveu o livro ‘Lembranças, Opiniões e Reflexões sobre Futebol’, pela editora DBA de São Paulo, que está lançando nacionalmente amanhã, na VII Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Em BH, o lançamento só será dia 16 de setembro, pelo Sempre um Papo. Depois, autor e obra vão a São Paulo e a outras capitais pelo País. (EM, 22 de agosto)

“Só a inteligência nos faz homens.”

Há um menino no Conjunto Habitacional do IAPI que joga entre os homens e arrebenta, disseram a Lincoln Alves, que há mais de trinta anos trabalha como descobridor de talentos para o Cruzeiro.

Ele foi lá para ver. E ficou deslumbrado: o garotinho era mesmo cobra. Ao se dirigir à casa dele e pedir autorização ao api do garoto para levá-lo ao Cruzeiro, Lincoln indicava para a glória um dos maiores jogadores brasileiros de todos os tempos: Eduardo Gonçalves de Andrade, tão miudinho que recebera do pessoal do IAPI o apelido de Tostão.

Depois de uma rápida passagem pelo América mineiro, o clube para o qual seu pai torcia, ele voltou para o Cruzeiro e direto para o futebol profissional. Quando o Mineirão foi inaugurado, dia 5 de setembro de 1965, já era o comandante da equipe que acabou deslumbrando o Brasil com seu futebol revolucionário. No ano seguinte, ele estava em Liverpool disputando a Copa da Inglaterra ao lado de Pelé e Garrincha – mas foi meses depois que se consagrou definitivamente ao conquistar com Dirceu Lopes, Raul & Cia. a VII Taça Brasil (Campeonato Brasileiro), derrotando na finalíssima (por 6×2 e 3×2) o Santos de Pelé , Gilmar e Zito.

Na Seleção, Tostão firmou-se como titular absoluto ao lado do Rei a partir de 1968. Culto, inteligente, profissional exemplar, amante da vida em família, timido e estudioso, tinha também um forte carisma. Com opiniões e posições políticas sempre sensatas – e absolutamente a favor da liberdade e da democracia – foi, em campo, o principal jogador na conquista do pentacampeonato mineiro, título que o Cruzeiro sempre perseguira.

Mais em seguida começou a viver o drama que abalou sua vida profissional e particular. Nos preparativos para a Copa do Mundo de 1970, levou uma bolada no olho esquerdo durante um amistoso contra a equipe do Millonarios de Bogotá, na Colômbia. A retina descolou-se. Examinado meses depois, teve de ser operado nos Estados Unidos. Zagalo, o técnico que substituiu João Saldanha, e o médico Lídio de Toledo não acreditavam que ele pudesse voltar a jogar. Mas seu oftalmologista garantiu que poderia e, em 1970, Tostão comandou o ataque do Brasil que deslumbrou o mundo no México.

Seu futebol fino, de toques geniais, passes perfeitos, e uma colocação em campo que desorientava qualquer macardor, tornou-o um dos maiores jogadores do mundo, exaltado por celebridades como Philip Rising ( da revista World Soccer), Pedro Escartin, Puskas, Stanley Mathews, Di Stefano etc. Foi personagem de um filme – Tostão, a Moeda de Ouro – e assunto de livros na Inglaterra, Japão, França, Espanha, México, Alemanha e Itália.

Em 1972, ele começou a se desligar do Cruzeiro, após uma excursão pelo mundo. Recusou-se a jogar sob as ordens do truculento técnico Iustrich, recém – contratado, e acabou sendo vendido ao Vasco da Gama por inacerditáveis 2,5 milhões de cruzeiros – um recorde na época.

Um ano mais tarde, o drama de Tostão voltou a se agravar. Seu olho esquerdo não estava bem e, ao ser examinado novamente nos Estados Unidos, recebeu a recomendação de parar de jogar futebol, pois corria o risco de ficar cego. E, aos 27 anos, ele abandonou os campos que tanto amava.

Nenhum comentário:

Postar um comentário